A Prebid ajusta os TID e devolve aos publishers o controlo sobre o sinal
A semana passada expôs dois movimentos que, na realidade, fazem parte da mesma batalha pelo controlo económico da publicidade digital. O primeiro é normativo e técnico: a Prebid.org modulou a alteração dos Transaction IDs (TID) para permitir que os publishers escolham entre um identificador global (único por impressão) ou um específico por SSP, após meses de críticas de compradores que viam comprometidos a deduplicação e o Supply Path Optimization (SPO). O segundo é industrial e tecnológico: Amazon Web Services (AWS) e Google Cloud intensificaram esforços para “absorver” o tempo real publicitário em fluxos cloud-native, de baixa latência e alto desempenho de IA — uma mudança com impacto direto nas contas de todo o ecossistema.
A “opcionalidade” introduzida pela Prebid está longe de ser um detalhe.
 Com TID global, os DSPs conseguem identificar quando múltiplos pedidos vêm da mesma impressão e evitar lances redundantes; com TID por SSP, os publishers limitam a fuga de sinais entre mercados e protegem o seu yield num contexto de margens cada vez mais estreitas. A coexistência dos dois modos reduz a tensão imediata, mas abre um cenário operacional mais complexo: cada publisher decidirá de acordo com o seu mix, pressão de preços, acordos com SSPs e tolerância ao leakage.
A resposta do lado buy-side: OpenAds e a “contabilidade de leilão”
A The Trade Desk respondeu com o OpenAds, uma bifurcação do próprio framework que restabelece, por desenho, a leitura global da impressão e reforça as sinalizações de verificação.
 O objetivo é duplo: preservar o investimento dos anunciantes no open internet com garantias de deduplicação e rastreabilidade, e ao mesmo tempo propor um conjunto de regras próprio — compatível, mas distinto — que devolve mais controlo ao lado comprador.
 O resultado prático é que o open internet passa agora a operar com duas linguagens técnicas em competição direta.
A intervenção do IAB Tech Lab, que classificou a versão de agosto como “materialmente não conforme” com o OpenRTB, revelou a tensão subjacente: quem define as regras e quem as aplica à escala?
 A Prebid escreve o código que corre em milhares de sites; o IAB Tech Lab guarda as especificações.
 O ajuste de outubro evitou uma rutura, mas não eliminou a fratura: o mercado percebeu o quão frágil é a confiança no RTB quando uma simples alteração de sinal pode abalar todo o sistema.
A outra batalha: a subasta como fluxo cloud-native
Longe do GitHub, AWS e Google Cloud estão a levar o processo de licitação e entrega para pipelines em cloud com inferência de IA embutida.
 A promessa é clara: menos latência, menor custo operacional e maior capacidade de executar modelos próprios em tempo real.
 A AWS avança com abstrações específicas para RTB; a GCP integra ad tech no seu stack de IA.
 Ambas competem para se tornarem a “placa-base” do negócio publicitário.
 Para vendors e publishers, estas escolhas têm impacto financeiro (saídas de dados, computação, armazenamento) e estratégico (dependência de fornecedor, portabilidade de modelos, conformidade regulatória).
Riscos e oportunidades
Para os publishers, permitir TID por SSP ajuda a defender preços e limitar fugas de informação, mas adiciona complexidade na integração e nos testes A/B entre rotas de leilão.
 Para os DSPs, o TID global simplifica a deduplicação, melhora o SPO e a eficiência económica, mas exige confiança no lado sell-side para não degradar o sinal.
 Para os SSPs, abre-se uma janela de diferenciação em qualidade de sinal, latência e transparência de taxas.
 Para os anunciantes, o panorama torna-se mais heterogéneo: a comparação entre fornecedores dependerá cada vez mais de métricas de qualidade (atenção, consistência criativa, brand lift) e rastreabilidade da cadeia de fornecimento, e não apenas de CPM ou viewability.
Segundo o Digiday, nos próximos meses será importante acompanhar:
A adoção efetiva do novo modo TID pelos publishers e a reação dos DSPs em termos de preços, filtros e listas de fornecimento.
A evolução do OpenAds — se permanecerá como uma camada “cooperativa” ou se se transformará num fork de facto que fragmente ainda mais o stack do open web.
A transposição da disputa AWS-GCP para contratos concretos — quem consegue reduzir milissegundos sem perder controlo e quem integra modelos próprios respeitando privacidade e portabilidade.
Mais do que uma disputa sobre um identificador, o setor está a decidir quem governa a confiança transacional e em que camada — norma, código ou infraestrutura — se ancora o valor.
 O investimento seguirá para onde confluam sinais legíveis, custos competitivos e garantias de resultado.
 O grande desafio do open internet será conseguir as três coisas ao mesmo tempo.