Amazon Ads: dos 17 mil milhões no Q3 ao assalto programático do Q4
A Amazon já não compete para captar investimento digital — compete para o absorver.
No terceiro trimestre de 2024, a Amazon Ads atingiu os 17 mil milhões de dólares em receitas publicitárias, um aumento de 26% face ao ano anterior.
Mais de metade desse crescimento vem de formatos programáticos e do seu DSP, a plataforma que liga os dados de compra, consumo e conteúdo do gigante do e-commerce a todo o inventário disponível — dentro e fora da Amazon.
A mensagem para o mercado é clara: o quarto trimestre não será apenas o do Prime Day ou da Black Friday, mas sim a ofensiva definitiva do Amazon DSP.
Do retail ao novo padrão de ativação
O que a Amazon está a tentar fazer com o seu DSP vai muito além do retail media.
A sua estratégia passa por redefinir a compra programática com base num ativo que mais ninguém possui: a ligação direta entre comportamento de compra e exposição publicitária.
Enquanto as agências continuam a debater data clean rooms e medição cross-media, a Amazon oferece algo mais pragmático: um ambiente fechado, seguro, mensurável e capaz de ligar exposição publicitária a compras reais.
Essa é a sua vantagem comparativa face ao The Trade Desk, Google DV360 ou até ao Meta Ads Manager: a rastreabilidade transacional.
No pitch que a Amazon apresentou às agências para o quarto trimestre, a empresa reforça três linhas de ação:
Unificação de audiências entre Amazon, Twitch e Freevee;
Expansão do inventário fora da Amazon através da rede de publishers que utilizam o seu SSP (Amazon Publisher Direct);
Integração nativa de medição e atribuição via Amazon Marketing Cloud.
O resultado é uma plataforma que já não compete por “formato”, mas sim pelo controlo do fluxo de dados.
O jogo silencioso da atribuição
O verdadeiro valor da ofensiva DSP não está nos CPMs, mas sim no modelo de medição.
A Amazon está a impulsionar uma mudança de mentalidade entre os grandes anunciantes: deixar de otimizar impressões para otimizar vendas atribuíveis dentro do seu ecossistema.
Com o Amazon Marketing Cloud, as equipas podem cruzar dados de exposição, pesquisa, compra e recorrência.
Em outras palavras, a Amazon tornou-se o seu próprio clean room, sem necessidade de interoperar com terceiros — o que coloca as agências numa posição desconfortável.
Se os clientes passam a confiar na Amazon para medir todo o funil, que papel sobra para o DSP independente ou para o trading desk dos grupos?
A transparência também se redefine: já não se trata de ver cada impressão, mas de confiar num modelo fechado — o de um ator que mede e executa.
O músculo operativo por trás do quarto trimestre
O impulso comercial da Amazon Ads para o último trimestre do ano tem um objetivo interno claro: consolidar o seu DSP como ferramenta de referência para performance e brand marketing em simultâneo.
O pitch partilhado com as agências mostra que a Amazon pretende migrar orçamentos de upper-funnel para o seu ecossistema, graças aos novos formatos de vídeo (Freevee e Prime Video com publicidade) e à integração com a Amazon Streaming TV.
Na prática, isto transforma o seu DSP num híbrido: performance na base, branding à superfície e dados próprios em todo o percurso.
E se há algo que distingue a Amazon das restantes big tech, é a sua capacidade de monetizar sem fricção.
Enquanto outros tentam equilibrar privacidade e segmentação, a Amazon resolve tudo dentro do seu próprio ecossistema autenticado.
A sua força não está na publicidade — está no dado transacional.
O que isto significa para o resto do mercado
Para os concorrentes, o avanço do Amazon DSP representa uma ameaça direta:
O The Trade Desk vê-se pressionado a provar que a independência tecnológica ainda é uma vantagem face aos walled gardens;
A Google, que combina o seu ecossistema de display com o YouTube, teme perder relevância em categorias de consumo onde a Amazon já concentra 70% das pesquisas de produto;
Os publishers premium assistem à Amazon a absorver investimento que antes fluía para eles via open market ou PMPs.
Segundo a Digiday, a médio prazo o risco para o ecossistema é claro: a consolidação da programática nas mãos de um punhado de plataformas fechadas, onde a interoperabilidade e a transparência voltarão a ser promessas, não realidades.
Na verdade, o plano da Amazon é mais político do que técnico.
Cada movimento no seu negócio publicitário reforça três posições:
o seu papel como mediador entre oferta e procura,
o controlo sobre a infraestrutura de dados comerciais,
e a sua influência sobre a forma como se mede o impacto publicitário global.
Na prática, o DSP é o cavalo de Troia para colonizar todo o funil publicitário — integrando inventário, medição e atribuição numa única camada — e colocando a Amazon no papel que outrora pertencia às agências de meios: o ponto onde se decide quem ganha e quem perde investimento.
A Amazon não está a construir um DSP; está a construir uma câmara fechada de verdade publicitária, onde cada impressão pode ser ligada a uma ação de compra.
Enquanto o resto do mercado ainda fala de interoperabilidade, a Amazon já opera sob uma lógica mais simples: fechar o círculo.
O terceiro trimestre provou que a empresa já consegue gerar mais receitas publicitárias do que o YouTube.
O quarto será o teste decisivo: conseguirá a Amazon redefinir as regras do mercado programático — sem pedir permissão?