Cinco anos depois, o Privacy Sandbox da Google sobrevive mais por necessidade do que por convicção

Quando a Google anunciou em 2020 a intenção de eliminar os third-party cookies no Chrome, provocou um verdadeiro terramoto no ecossistema publicitário digital. Agências, publishers, marcas e fornecedores tecnológicos deram início a uma corrida por alternativas viáveis num futuro cookieless. A proposta da Google para resolver o desafio foi o Privacy Sandbox — uma iniciativa que prometia proteger a privacidade do utilizador sem comprometer a eficácia da publicidade. Cinco anos depois, o cenário é bem diferente: as cookies ainda existem e o Sandbox perdeu grande parte do seu ímpeto e da credibilidade inicial.

Adoção tímida, mas ainda presente

Apesar do desânimo do setor, dados recentes mostram que o projeto ainda não foi descartado. Um estudo académico liderado por Garrett Johnson, professor da Universidade de Boston, revela que cerca de 30% dos 59.000 websites analisados ainda utilizam a Topics API, um dos principais componentes do Privacy Sandbox. A adoção não cresceu em relação a 2024, mas também não regrediu — sinal de que algumas empresas continuam a explorar o seu potencial.

“Não creio que a Google vá abandonar completamente o Privacy Sandbox, embora hoje já nada surpreenda. É verdade que o projeto perdeu força, mas ainda há sinais de vida”, comenta Johnson à AdExchanger.

Eficácia económica em causa

Mais do que o uso técnico, a grande dúvida é se o Sandbox consegue preservar o valor económico para os publishers e anunciantes. Até agora, os sinais não são animadores. Um teste de campo realizado por Johnson e a rede de publishers Raptive (com mais de 200 milhões de impressões) mostrou que:

  • O valor médio dos anúncios cai 29,1% sem cookies;

  • Com o Privacy Sandbox, a queda é de 27,9%;

  • Ou seja, o Sandbox recupera apenas 4,2% do valor perdido.

Este desempenho limitado deve-se, em grande parte, ao Protected Audience API (PAAPI), que introduz latência elevada, atrasa a entrega dos anúncios e reduz as oportunidades reais de monetização. Se os anúncios não são carregados a tempo, não são exibidos nem geram receita.

Europa: um contexto mais fértil (por obrigação)

Curiosamente, a exceção vem da Europa. Devido às normas rigorosas de privacidade (como o RGPD) e a uma taxa muito elevada de rejeição de cookies pelos utilizadores (43% contra 19% nos EUA), os publishers europeus foram forçados a adaptar-se mais rapidamente. Neste cenário, o Sandbox conseguiu recuperar 22% do valor publicitário perdido — um número ainda insuficiente, mas superior ao dos testes globais.

“Em contextos onde não se pode usar cookies nem exigir autenticação a todos os utilizadores, soluções como o Sandbox podem ser utilitárias, mesmo que estejam longe do ideal”, explica Johnson.

Uma solução “tampão” num futuro incerto

O Privacy Sandbox não cumpriu a promessa inicial nem provou ser uma substituição eficaz aos third-party cookies. No entanto, ainda não foi descartado. Enquanto uma parte da indústria olha para o projeto com ceticismo (e outra já o ignora por completo), há quem ainda o veja como um plano B necessário em ambientes regulatórios mais restritivos.

O futuro do Sandbox dependerá de dois fatores principais:

  1. Que a Google resolva os problemas técnicos que afetam o desempenho das suas APIs;

  2. Que consiga convencer o mercado de que esta proposta pode ser uma alternativa viável antes que a indústria opte por outras soluções.

Hoje, o Privacy Sandbox já não é a grande promessa do futuro publicitário. É, sim, uma solução intermédia, que resiste mais por necessidade do que por convicção. A sua relevância dependerá da evolução técnica, do contexto regulatório e, sobretudo, da paciência dos players do ecossistema digital.

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