O email como novo muro de contenção do Open Internet
O mais recente MadTech Sketch de Ciaran O'Kane no seu meio, ExchangeWire, intitulado "The Open Internet – Email As An Ad Channel", centra-se numa tese crítica para o futuro da monetização dos publishers: o email — especificamente o das newsletters — está a ressurgir como um canal essencial de distribuição e monetização, atuando como um “muro de contenção” perante a contração da open web tradicional, sobretudo agora que falamos de Zero Click Search, entre outras tendências.
Ciaran parte de uma ideia que na PROGRAMMATIC SPAIN repetimos muitas vezes quando falamos de retail media, áudio ou CTV: a open web clássica (sites abertos, tráfego de referência do Google ou das redes sociais) está em declínio estrutural, mas o open internet é muito mais amplo — inclui DOOH, retail media, apps, áudio, CTV… e também o email.
O que ele está a defender é simples: se olharmos apenas para o display web e para as cookies, parece que tudo está a morrer. Mas se ampliarmos o âmbito e analisarmos o conjunto de canais “abertos” onde é possível comprar publicidade fora dos walled gardens, a fotografia muda — e um dos canais mais ignorados é precisamente o email. É neste contexto que publica um dos seus sketches característicos: um diagrama que oferece uma fotografia clara de como o email funciona como canal publicitário dentro do open internet e porque está tão subvalorizado.
Email Demand Stack: como compra hoje a procura
No lado esquerdo do diagrama surge o “Email Demand Stack”, composto por três camadas:
Direct sold / IOs: É o modelo tradicional: acordos diretos entre publisher e anunciante ou agência, com CPM fixo, tenancy em newsletters, patrocínios, etc. Ciaran lembra que “a maioria dos publishers vende assim o seu inventário de email”. O canal é gerido quase como um patrocínio, não como programática.
Curated deals: Aqui está uma das ideias-chave do esquema. Pelas particularidades do email (templates, HTML limitado, dados do subscritor, etc.), há muito espaço para deals curados: pacotes de inventário e audiências extremamente específicos, montados por especialistas.
É um canal perfeito para curation, porque o inventário é finito, altamente qualificado e com um contexto forte (newsletter temática, remetente reconhecido).Programática Aberta (Open): A parte do inventário que desce para programática aberta tende a ir parar a SSPs genéricas, a CPCs baixos. Ciaran rotula este espaço como “undervalued channel”: muito remanescente de newsletters está a ser vendido quase como long tail, sem respeito pela sua qualidade real.
A tese é clara: a forma como a procura compra “email” está desalinhada com o verdadeiro valor do canal. Há demasiada IO manual, pouca curation estruturada e um “resto” que cai no open market sem critério.
Email ad tech stack: porque é necessária tecnologia específica
No centro do sketch surge o “Email Ad Tech Stack”, com um bloco de Ad server e Exchange e, mais abaixo, quatro players: LiveIntent, Google (GAM), Passendo e beehiiv.
O que está a dizer Ciaran?
O email não pode ser resolvido com o stack padrão de display:
HTML limitado
bloqueadores
templates rígidos
clientes de email diferentes
Não se pode simplesmente colar uma tag normal de display e esperar que funcione.
Por isso é necessário um ad server e/ou exchange especializado em email:
LiveIntent posiciona-se há anos como “email ad tech”: transforma impressões de email em inventário endereçável, com identidade baseada no endereço de email.
Passendo oferece capacidades semelhantes do lado de ad serving / SSP para newsletters.
beehiiv representa as plataformas de newsletters que já trazem ad stack integrado.
Google Ad Manager aparece como lembrete de que a Google também joga neste espaço — mas não domina o email como domina o display.
O bloco amarelo reforça a ideia: “Why a specialist stack is required?”
Em resumo:
Os anúncios têm de ser renderizados dentro das limitações do HTML de email.
É preciso otimizar o placement nas templates (topo, meio, fundo, blocos patrocinados, nativo…).
O targeting baseia-se em dados do subscritor, não em cookies.
O objetivo é maximizar o yield das newsletters ligando-as a fontes de procura específicas para email, não apenas ao DSP do costume.
A leitura é simples: há espaço para AdTech especializada — não basta um DSP dizer “também compramos email”.
Data Layer: identity e sinais de primeira parte
Na parte superior surge o “Data Layer”, que inclui 1PD e 3PD (apenas se HEM-based, consentido e compatível com o identity graph), enviados para o ad server.
Em linguagem PS: o email é, por natureza, um canal baseado em identidade de primeira parte.
O publisher tem:
email do subscritor
consentimento
preferências
histórico de engagement
Esta identidade pode ser mapeada para grafos como hashed email, RampID, UID2, etc.
Isto permite segmentação, frequency capping cross-canal, atribuição e enriquecimento com 3rd-party data (desde que venha em formato hashed + consentimento).
Ciaran sublinha que o email encaixa na era pós-cookies: já é um identificador persistente. Comparado com o caos do addressability na web aberta, percebe-se porque diz que a open web se contrai mas o open internet — incluindo o email — não.
Supply: onde entra o retail media
No lado direito está o bloco de “Supply”: Retail Media, Publisher e Supply Aggregation.
À medida que as RMNs querem monetizar o seu supply omnicanal — onsite, offsite, app, CTV, DOOH —, o email torna-se peça central.
Os retailers têm bases de dados e newsletters próprias e esses emails são supply de altíssima intenção: compras, tickets médios, histórico.
Integrar esse inventário numa RMN permite fechar o loop impressão → clique → visita → compra com enorme precisão.
A parte de “Supply Aggregation” remete para redes que juntam newsletters de múltiplos publishers e retailers e as empacotam para a procura — uma espécie de “rede de email” dentro do open internet.
A mensagem:
uma RMN omnicanal sem estratégia robusta de email está incompleta — e está a perder dinheiro.
Medição: do performance ao mid/upper funnel
Historicamente, email = performance:
aberturas
cliques
conversões
Mas já existem métricas de marca: brand lift, atenção, incrementalidade.
Ou seja, email aproxima-se dos restantes canais do open internet — DOOH, CTV, audio, retail media — onde a fronteira entre brand e performance se está a dissolver.
A mensagem de fundo: email é um “overlooked ecosystem” cheio de ineficiências
O diagnóstico de Ciaran é direto:
O email é um canal crítico, subvalorizado e subservido pelo AdTech.
Os publishers refugiaram-se nele, construindo fossos competitivos (listas, newsletters, relações diretas). Mas a camada programática não acompanhou.
Temos um desajuste enorme entre valor vs preço:
bases muito qualificadas e com identidade forte vendidas via IOs manuais ou despejadas no open market a CPC de saldo.
Além disso:
O ecossistema é complexo e muitos buyers não sabem como o ativar.
Falta standardização no planeamento omnicanal.
Falta integração nos dashboards de retail/commerce media.
Falta produto.
Falta educação.
Os vendors do sketch — LiveIntent, Passendo, beehiiv, Google GAM — são apenas o início de uma nova categoria: email ad tech especializado.
A ter em conta:
Para publishers: O email não é só fidelização. É inventário premium, com identidade forte. Vale investir num stack próprio, curated deals e integração em retail/commerce media.
Para anunciantes e agências: Provavelmente tens o email encostado ao CRM. Mas a combinação de identity + contexto + métricas faz dele um canal perfeito fora dos walled gardens.
Para empresas de AdTech: A oportunidade está clara - normalizar acesso ao inventário; integrá-lo com identity graphs e RMNs; resolver render, targeting e measurement; transformar o canal num stack industrializado
Conclusão
O diagrama de Ciaran não é apenas um sketch bonito.
É uma tese clara: O email é um ecossistema crucial do open internet, cheio de fricção técnica e ineficiências comerciais — e quem o industrializar tem uma oportunidade gigantesca pela frente.

