YouTube e Netflix: a concorrência que está a redefinir o consumo audiovisual
No contexto da proposta de aquisição da Warner Bros. Discovery, da HBO e de outros serviços de streaming por parte da Netflix — e perante as acusações de que o acordo poderia ser anticoncorrencial — Greg Peters, co-CEO da empresa, apontou o YouTube como um concorrente legítimo, sublinhando que, mesmo com a integração da Warner Bros., a Netflix continuaria atrás da plataforma da Google.
No mercado audiovisual, a concorrência já não se define apenas por quem detém a maior biblioteca de conteúdos ou quem consegue atrair mais subscritores. Hoje, o foco está em quem conquista a atenção do público, molda hábitos de consumo e se torna o destino natural quando os utilizadores ligam um ecrã. Esta mudança reflecte-se claramente na estratégia da Netflix, que deixou de competir apenas com outros serviços de streaming e passou a medir forças, de forma directa, com o YouTube.
Em termos de visualização, o YouTube lidera a disputa, ultrapassando a Netflix. De acordo com os dados da Nielsen relativos ao mês de Outubro, o YouTube ocupa o primeiro lugar entre os serviços de streaming no que respeita à utilização total de televisão, concentrando 12,9% do tempo de visualização — um crescimento de 4% face ao mês anterior. Em comparação, a Netflix surge na sexta posição, com 8%.
Embora a Netflix continue a expandir a sua base de utilizadores a nível global, o YouTube mantém a liderança em utilizadores activos. Segundo as previsões da eMarketer, divulgadas em Outubro e que incluem utilizadores de qualquer idade que vejam Netflix ou YouTube pelo menos uma vez por mês, estima-se que a Netflix atinja os 202,5 milhões de utilizadores até ao final de 2025, crescendo para 209,7 milhões em 2026 e 215,4 milhões em 2027. Já o YouTube deverá superar estes valores, alcançando 249,9 milhões de utilizadores no final deste ano e crescendo para 255,3 milhões em 2026 e 260,2 milhões em 2027.
O YouTube lidera também em termos de receitas e de horas de visualização, superando a Netflix por uma margem significativa. Segundo dados da Owl & Co, durante o primeiro semestre de 2025, ambas as plataformas geraram, em conjunto, cerca de 10 mil milhões de dólares em receitas. No entanto, a distribuição destes valores evidencia uma vantagem clara do YouTube. A plataforma da Google registou receitas de 28 mil milhões de dólares, um crescimento de 17% em relação ao ano anterior, enquanto a Netflix arrecadou 21,6 mil milhões, o que representa um aumento de 14% face ao mesmo período de 2024. Esta diferença é ainda mais visível no tempo de visualização: o YouTube atingiu 835 mil milhões de horas, contra 95 mil milhões da Netflix, de acordo com a Owl & Co.
Quando os utilizadores não sabem o que ver, recorrem ao YouTube
O comportamento dos utilizadores no consumo de conteúdos mudou de forma significativa, com o streaming a consolidar-se como uma das principais formas de entretenimento. Se a Netflix transformou o local onde se consome televisão, o YouTube alterou os hábitos diários de consumo — não apenas no tipo de conteúdos vistos, mas também na forma como são consumidos.
“O YouTube domina o vídeo, e o que está a mudar agora é a forma como o conteúdo está a evoluir”, afirma Hermelinda Fernández, senior vice president de investimento digital na Canvas Worldwide, em declarações ao Digiday. “Os podcasts são gigantes e todos os grandes programas de podcast estão no YouTube. As pessoas consomem-nos como se fossem prime time shows na sua CTV, na sala de estar. Os Shorts também registaram um crescimento significativo e, apesar de serem um formato vertical, são vistos em ecrãs de CTV. O YouTube não domina apenas o reality content; controla agora também o espaço dos vodcasts e do vídeo vertical”, acrescenta. Shamsul Chowdhury, antigo executivo da Jellyfish e especialista em redes sociais, partilha da mesma visão e sublinha que “o YouTube evoluiu enormemente nos últimos 10 anos e, com o YouTube TV, a Google procura construir uma narrativa comercial convincente que demonstre a eficiência de custos entre a televisão linear e a CTV”.
Quando os utilizadores não encontram algo para ver na televisão ou noutros serviços de streaming, a maioria acaba por recorrer ao YouTube, segundo dados da HUB Entertainment Research. Cerca de 80% dos inquiridos afirmam que recorrem frequentemente ou ocasionalmente ao YouTube quando não encontram conteúdos noutras plataformas. O YouTube não é apenas uma aplicação adicional ou um “plano B” quando as restantes falham. Tem a capacidade de captar momentos de indecisão e aborrecimento que nenhuma outra plataforma consegue aproveitar da mesma forma. De acordo com o estudo, 90% dos utilizadores entre os 16 e os 34 anos recorrem ao YouTube nessas situações, assim como 73% dos utilizadores com mais de 35 anos.

