A pressão por maior transparência na medição publicitária intensifica-se

Num contexto em que as principais plataformas da internet se preparam para aumentar a sua quota no investimento publicitário e em que os planos de meios parecem incompletos sem, pelo menos, um componente de IA, os anunciantes revelam uma crescente inquietação quanto ao que realmente acontece dentro dessas “caixas negras”. A exigência de maior transparência na medição de dados tornou-se uma prioridade, à medida que o ecossistema publicitário evolui a um ritmo acelerado.

Para além das plataformas mais conhecidas, como a Performance Max da Google, a Advantage+ da Meta ou a Performance+ da Amazon, começa a ganhar peso o debate sobre a fiabilidade dos programas de medição de terceiros, sobretudo em plataformas como o YouTube e a Meta, que já operam neste regime há mais de uma década. Estes programas permitem que um conjunto restrito de empresas de verificação, aprovadas pelas plataformas e, em muitos casos, acreditadas pelo Media Ratings Council, ofereçam maior segurança aos anunciantes de que estão a obter aquilo por que pagam num ambiente historicamente difícil de auditar.

Contudo, uma crença profundamente enraizada na publicidade digital começa agora a ser posta em causa: se as marcas devem pagar a empresas de verificação independentes pela medição de viewability dentro dos walled gardens. A Zefr está a desafiar abertamente esta premissa ao adotar uma abordagem que poderá abalar os modelos tradicionais de preços de gigantes do setor como a DoubleVerify e a Integral Ad Science (IAS). Rich Raddon, CEO da Zefr, afirmou ao Digiday que a empresa — já acreditada em viewability no YouTube e em processo de obter a mesma acreditação para outras plataformas — planeia disponibilizar esta métrica gratuitamente nos walled gardens, começando pelo TikTok e expandindo depois para outros ambientes. Segundo Raddon, este movimento nasce daquilo que identifica como uma crescente discrepância entre a perceção do mercado sobre como funciona a medição nestas plataformas e o seu funcionamento real. De acordo com a Zefr, dentro dos walled gardens a viewability é, na prática, uma métrica “de passagem”: a informação é fornecida gratuitamente pelas plataformas e não existe medição direta. A empresa afirma que o seu modelo mudará esta dinâmica, tornando-a substancialmente diferente da oferta dos outros fornecedores.

A diferença entre walled gardens e a Open Web

Importa referir que, segundo vários especialistas ouvidos pelo Digiday, isto não significa que os programas de medição “não sejam importantes, valiosos ou independentes”. Contudo, diz Raddon, os fornecedores de verificação “cobram o mesmo pela medição de viewability dentro dos walled gardens do que na Open Web, apesar do esforço ser significativamente menor”, o que tem gerado custos desnecessariamente elevados para os anunciantes. Estes programas, que funcionam há quase uma década, podem ter levado as marcas a “gastar dezenas de milhões numa métrica de passagem que nunca deveria ter sido paga”. “Hoje é uma chamada de atenção para o mercado. Ao contrário da Open Web, os walled gardens disponibilizaram métricas de viewability gratuitas aos fornecedores de medição, que depois adicionaram alguma lógica a esses dados e os venderam como produtos premium”, acrescentou. “Ao tornar as métricas de viewability gratuitas nos walled gardens, a Zefr está a reforçar um ponto fundamental: os walled gardens são diferentes da Open Web.”

O argumento da Zefr surge num contexto em que o escrutínio histórico do mercado tem sido muito mais rigoroso sobre o investimento na Open Web do que nos walled gardens. “Há sempre questões sobre a publicidade programática na Open Web, mas muitos não sabem realmente o que estão a pagar dentro dos walled gardens”, afirmou Ravi Patel, CEO da SWYM. Patel acrescenta que, dado que a maioria dos anunciantes concentra nestes ambientes grande parte dos seus orçamentos, estes deveriam ser alvo de um escrutínio muito mais constante. “Diria que existe algum grau de complacência sobre o entendimento da operação publicitária e do que realmente se está a comprar hoje.”

Joshua Koran, especialista em AdTech, reforça que a crescente dependência de plataformas alimentadas por IA — como a Performance Max da Google —, em que os compradores “definem o objetivo, carregam num botão e deixam a caixa negra resolver”, continuará a aumentar. No entanto, alerta que a medição independente permanece crucial para evitar desperdícios significativos. Para Koran, a solução passa também por auditorias a nível de evento, e não apenas a nível de domínio.

Processo MRC

A Zefr indicou que espera receber a acreditação do MRC para brand safety ao nível do conteúdo entre meados e o final de janeiro, um passo que reforçaria a sua posição como alternativa às grandes firmas de verificação. Este anúncio surge num momento em que o próprio MRC está a rever parte do seu enquadramento de medição, sobretudo ao distinguir entre “acreditação ao nível da propriedade” e “acreditação ao nível do conteúdo”. Esta separação tem gerado fricções na indústria, afetada por plataformas e fornecedores que, segundo alguns especialistas, “apenas oferecem verificação ao nível da propriedade, sem uma análise real ao nível do conteúdo”.

A decisão recente da Meta de abandonar as auditorias de brand safety de first-party do MRC — optando por confiar exclusivamente nos seus parceiros de third-party para fornecer às marcas informação sobre as suas compras de meios — intensificou ainda mais a tensão no mercado.

Um desafio para o mercado

O CEO da Zefr, Rich Raddon, tem apelado às marcas para questionarem aquilo por que pagam e evitarem “confiar cegamente nos fornecedores independentes”. Esta mensagem começa a ganhar força entre os compradores de meios, cada vez mais dispostos a reavaliar a clareza dos serviços contratados. Rachel Mervis, executiva com vasta experiência em AdTech, especialmente em verificação, partilhou preocupações semelhantes sobre a falta de transparência nos dados que chegam aos anunciantes. Segundo Mervis, embora muitas plataformas organizem fóruns para escutar os anunciantes e os principais fornecedores afirmem ter em conta as suas preocupações, persistem limitações. “Recordo-me de limitações que eram frustrantes, porque queríamos ver determinados componentes ou aprofundar mais… os programas de medição eram amplos e finitos”, explicou.

O futuro deste debate permanece incerto. Apesar de a indústria parecer estar a adotar estes ajustamentos de forma gradual, não é claro se os players tradicionais irão responder com contra-argumentos. Ainda assim, Raddon considera que este é um momento crucial para um reinício do mercado: “Os walled gardens são diferentes da Open Web”, reiterou, sublinhando que as marcas já não deveriam pagar por métricas que têm origem dentro das próprias plataformas.

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