Publishers pressionam a Google por acordos de IA que garantam receitas justas, transparência e controlo
A Google inicia conversações com publishers sobre acordos de IA: receitas justas, transparência e controlo no centro das exigências
A Google deu início a conversações exploratórias com publishers sobre possíveis acordos de licenciamento de conteúdo para inteligência artificial, num momento marcado pela ascensão de modelos generativos como o Gemini e produtos como os AI Overviews. Embora o movimento represente uma mudança após anos de resistência, muitos responsáveis editoriais encaram-no com ceticismo: já viram promessas de “parcerias” transformarem-se em maior dependência das plataformas, e não em alianças equilibradas.
Segundo o Digiday, a Google já contactou pelo menos 20 grupos editoriais nos EUA. As conversas estão numa fase preliminar, mas os meios de comunicação convergem em três exigências centrais: receitas proporcionais ao valor aportado, transparência total sobre o uso do conteúdo e controlo sobre como esse conteúdo é utilizado e exibido nos produtos de IA.
📌 Receita justa e modelo híbrido de compensação
Durante anos, os publishers alimentaram o ecossistema da Google com o seu conteúdo, sem compensação direta pelo uso no treino de modelos de IA. Agora, exigem acordos que combinem pagamentos iniciais com variáveis ligadas ao uso continuado, semelhantes aos pactos assinados pela OpenAI com a Associated Press ou o Axel Springer.
“É preciso assumir que o pagamento inicial será o único dinheiro que verás. Por isso queremos modelos híbridos que reflitam o uso real”, afirmou ao Digiday um executivo de vendas de um grande grupo editorial.
A principal preocupação é serem relegados a meros fornecedores invisíveis, enquanto produtos como AI Overviews reduzem o tráfego orgânico sem oferecer uma compensação proporcional.
📌 Transparência e controlo sobre o conteúdo
Mais do que dinheiro, os publishers pedem algo crucial: visibilidade sobre como o conteúdo é usado e a capacidade de decidir onde e em que condições aparece. Até agora, esse nível de transparência tem sido praticamente inexistente.
“Quanto melhor entendermos como os algoritmos de IA usam os nossos dados, melhor poderemos ajustar as nossas estratégias”, disse um publisher citado pelo Digiday.
Os meios querem acesso a APIs com atualizações em tempo real, protocolos de atribuição e exclusão padronizados, além de clareza sobre se o conteúdo é usado para treino, inferência ou ambos. Produtos como AI Overviews levantam críticas adicionais, já que a Google não fornece métricas claras sobre o impacto no tráfego ou na visibilidade das marcas de media, dificultando qualquer análise estratégica.
“Isto tem de mudar. Precisamos de acesso aos dados para perceber como estamos a ser afetados”, alerta Jacob Salamon, VP de desenvolvimento de negócio da Trusted Media Brands.
📌 Estabilidade jurídica e parcerias de longo prazo
A terceira exigência é mais difícil de quantificar, mas igualmente vital: estabilidade e previsibilidade num mercado volátil. Os publishers pedem acordos renováveis que transcendam licenças pontuais e avancem para verdadeiras alianças estratégicas.
“O nosso modelo ideal seria uma parceria baseada em transparência radical, co-desenvolvimento e partilha de valor”, defende Salamon, que lidera o comité de IA na sua empresa.
Isso inclui participação no design dos produtos, acesso a ferramentas de gestão de conteúdo em IA, garantias legais sobre os direitos e duração do uso, e uma estrutura flexível para acompanhar mudanças tecnológicas ou regulatórias. Há também um receio claro: se não forem negociadas agora condições justas, os publishers poderão ficar presos em acordos desfavoráveis quando a monetização da IA começar a escalar, como alerta Paul Bannister, Chief Strategy Officer na Raptive.
📌 Um pano de fundo regulatório cada vez mais intenso
Estas negociações decorrem sob crescente pressão regulatória. Nos EUA, a ação do The New York Times contra a OpenAI pode criar um precedente para os futuros acordos. Na Europa, cresce o escrutínio sobre o uso de conteúdo editorial por plataformas tecnológicas sem licença.
Entretanto, os publishers enfrentam queda no tráfego orgânico e uma visibilidade cada vez mais fragmentada nos produtos da Google. Para muitos, os acordos de IA serão o filtro decisivo entre os meios que sobrevivem e os que ficam pelo caminho.
“Vamos assistir a uma erosão contínua de utilizadores a aceder diretamente a sites para ler artigos. Estes acordos definirão quem consegue adaptar-se… e quem não consegue”, conclui Matt Prohaska, CEO da Prohaska Consulting.