Os publishers querem pôr fim ao scraping por IA e obter uma compensação justa pelo seu conteúdo
O scraping por IA tornou-se uma das principais preocupações para os publishers. O uso generalizado de ferramentas de inteligência artificial para extrair conteúdo de forma automatizada colocou à prova a capacidade dos publishers de proteger a sua propriedade intelectual e salvaguardar os seus modelos de negócio. O que começou como uma preocupação menor transformou-se num desafio que exige criação de regras e regulações capazes de proteger o valor do conteúdo e impedir que estas práticas continuem a impactar negativamente a indústriaa .
Embora o dano já esteja feito no que diz respeito à forma como as empresas de IA treinaram os seus modelos recorrendo aos arquivos dos publishers, a indústria está agora a lutar para definir as regras do jogo para o futuro. Os publishers defendem um ecossistema de IA justo, regulado e estruturado, no qual as empresas de IA não invistam apenas em poder computacional, mas também compensem os dados que alimentam os seus LLMs.
Numa recente sondagem realizada pela Digiday junto de 10 publishers, a conclusão foi clara: o modelo atual não é sustentável. Matt Roberson, diretor de políticas públicas globais do Financial Times, resumiu a situação de forma contundente: “Tal como Ebenezer Scrooge, muitos dos maiores developers de IA continuam a extrair valor comercial do trabalho humano — material protegido por direitos de autor escrito por pessoas — sem pagar por ele. Esta postura não é sustentável e tem de mudar.”
2025 dá passos rumo a uma regulação mais rigorosa
Ao longo de 2025, começaram a surgir alguns sinais positivos. Empresas como a Cloudflare passaram a permitir que os publishers bloqueiem o scraping por IA não desejado, enquanto a Amazon e a Microsoft começaram a pagar a meios como o The New York Times, a Condé Nast e a Hearst pelo acesso aos seus conteúdos para treino de modelos de IA. A Meta também anunciou acordos de licenciamento com vários publishers relevantes. Estes movimentos reforçam uma tendência clara: a crescente necessidade de conteúdo de elevada qualidade para alimentar os motores de IA. À medida que a IA se integra cada vez mais no ecossistema dos media, os publishers sabem que o conteúdo premium será um fator crítico de diferenciação competitiva.
O desafio do valor da audiência impulsionada por IA
Olhando para 2026, um dos principais desafios para os publishers será redefinir quais as métricas que devem substituir as pageviews como KPI central. Com a queda das taxas de clique e o crescimento da pesquisa sem cliques, os publishers enfrentam a necessidade de inovar na forma como distribuem conteúdos e mantêm as audiências dentro dos seus sites.
Nina Gould, diretora de inovação da Forbes, refere à Digiday que a dependência dos cliques como medida de impacto está a tornar-se obsoleta e acrescenta que “os publishers precisam de um novo índice de valor para quantificar até que ponto o jornalismo de qualidade influencia os sistemas de IA e envolve as audiências”. Para Gould, 2026 deverá ser o ano em que os publishers colaboram para definir métricas que reflitam confiança, autoridade e impacto informativo, indo além das métricas tradicionais de tráfego.
Por sua vez, Nada Arnot, vice-presidente de marketing do The Economist, defende que os motores de IA devem devolver tráfego aos publishers, tal como acontecia no auge da pesquisa orgânica. “Este ano, o tráfego orgânico caiu drasticamente à medida que as ferramentas de IA generativa interceptam o caminho até ao conteúdo dos publishers”, afirma. Apesar do crescimento da adoção da pesquisa por IA, ainda não existe uma troca de valor clara para os criadores de conteúdo.
A urgência de reforçar os first-party data
Os publishers estão a reforçar cada vez mais os seus ativos de first-party data. Desde programas de fidelização à recolha de dados de e-commerce, existe hoje uma urgência evidente em transformar estes recursos numa vantagem estratégica. Com o desaparecimento dos third-party data e a crescente influência da IA na distribuição de conteúdos, abre-se uma oportunidade única para construir relações mais sólidas com as audiências, baseadas na confiança e no consentimento.
Um novo ecossistema de colaboração com a IA
A pressão para que os publishers se adaptem ao novo ecossistema de IA não é apenas interna, mas também externa. Como refere Noy Freedman, vice-presidente de parcerias estratégicas da Minute Media, a indústria precisa de uma experiência de descoberta orientada por IA que ajude os utilizadores a encontrar e apoiar marcas de media de confiança, em vez de replicar conteúdos de baixa qualidade. Já Stefan Betzold, diretor de marketing do Bauer Media Group, sublinha a necessidade urgente de evoluir de um “scraping por IA sem regras” para um modelo de colaboração baseado em standards. A criação de normas para licenciamento de IA poderá ser o passo decisivo para travar a invasão de bots e garantir uma compensação justa aos publishers.
O futuro: colaboração e regulação
Em 2026, espera-se que os esforços para normalizar os pagamentos aos publishers pelo uso dos seus conteúdos por empresas de IA deem origem a um novo modelo de colaboração. Muitos publishers, como o Financial Times, já estão a adaptar-se a esta realidade, estabelecendo relações mais equilibradas com as empresas de IA.
Apesar de ainda estarmos longe de uma transformação total, os publishers estão a tomar medidas concretas para proteger os seus interesses. O futuro da indústria — pelo menos no contexto da publicidade digital — dependerá, em grande medida, da capacidade dos publishers de se adaptarem a estas mudanças e da disposição das empresas de IA em reconhecerem o valor do conteúdo de qualidade.

